quarta-feira, 2 de setembro de 2009

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Da morte e do paraíso. Henry de Montherlant dizia que nos “morremos quando não há mais ninguém por quem queiramos viver”. Mas isso é poesia, discurso de poeta. Diferentemente, afirmo como todas as letras: Não há ninguém, além de nós mesmos, por quem queiramos viver ou morrer. Mas podemos dizer o dito de modo melhorado – afinal, isto aqui não é poesia, realmente. Acontece que esse negócio de “ninguém, além de nós mesmos”, me acreditem, não tem mistério algum; não tem profundidade alguma. É que, às vezes, as coisas são tão evidentes que aparentam obscuras, profundas, misteriosas. Fernando Pessoa, em relação a esse mistério, essa profundidade das (ou nas) coisas, dizia que “mistério mesmo é haver quem pense o mistério”, e só; pois que tudo o mais é muito simples – mesmo que nos escape à compreensão mais imediata. E, afinal, nada existe para ser compreendido mesmo, tudo existe para ser vivido, experienciado. E pra não ir muito longe, mas para não deixar tudo assim, tão solto, lembramos de Paul Valéry que, da etimologia das palavras, dizia que não há uma só que possamos compreender, se formos a fundo. E aqui, e assim, exatamente aqui, esbarramos nas contradições da vida. A maior delas começa logo que nascemos: nascer é, já, começar a morrer. Vive-se para morrer. Mas, dado o paradoxo, a Vontade da vida não gosta disso; daí o seu mecanismo maior de autopreservação: o desejo. Desejar o homem ou a mulher que você ama, por exemplo, é obedecer aos apelos mais simples da Vontade da vida, do seu instinto mais primitivo. Sem o desejo não haveria o coito, sem o coito a vida dos pais não seria repassada aos filhos. Kierkegaard, vendo os tantos absurdos do mundo, numa das suas insinuações mais intimistas, falava de um suicídio ético universal: todo mundo pára de procriar e, assim, cessa o processo contínuo de trazer indivíduos à vida, ação que alimenta a morte; assim também cessa, de uma vez para sempre, as desgraças, as angustias, a doença mortal. No final das contas, ou no final de tudo, e se assim fosse, o mundo alcançaria a paz tão sonhada, a paz perpétua, o silêncio paradisíaco - o Todo/tudo e o Nada, que é, inevitavelmente, o lugar para onde todos se dirigem; pois que o homem é, essencialmente, memória, consciência.

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo