sexta-feira, 18 de setembro de 2009

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Das canções de Beuern. Os clerici vagi (clérigos vagantes), assim chamados, foram padres que, desempregados, entre os séculos XI e XII, principalmente na França e na Alemanha, utilizaram seus talentos literários para compor as canções de Beuern (as Carmina Burana – como são mais conhecidas), que são canções jocosas, satíricas e, mesmo, eróticas. Na luta entre a carne e o espírito, muitas vezes é a carne quem triunfa. Nas palavras de Maurice van Woensel: “Boa parte da poesia profana medieval foi escrita pelos clérigos desempregados da época”. Também, pudera: “Havia mais clérigos do que prebendas, e constituiu-se afinal um ‘proletariado latino’: os ‘clerici vagi’. [...] Entre eles nasceu uma poesia antiascética, pendant estranho da hinografia”, afirma O. M. Carpeaux em sua História da literatura ocidental. Mais adiante, Carpeaux acrescenta que muitos estudantes da época, que viajavam de uma escola à outra, se juntavam a “outros clérigos fugitivos da disciplina rigorosa dos conventos”, e nessa liberdade, longe do claustro, e mesmo nele, “se perdiam na vida devassa e até criminosa das estradas reais, outros na anarquia moral das grandes cidades como Paris”. É que, além do amor a Deus (metafísico), do qual nada sabiam além do vacilante exercício da fé, os padres também – e principalmente esses, desempregados e desesperados – conheciam o amor romântico, erótico; aliás, o único que realmente conheciam - pois, para Eros, basta estar vivo. Os hinos das canções de Beuern celebram esse amor, sob muitos aspectos. No poema 87, por exemplo, consta que “O Amor em todos manda, / corações abranda, / em toda parte anda: / Amor suave, tal o mel, / ou amargo, como fel. / O cego Amor / desconhece pudor: / ora é gelo, ora um forno, / hora é morno, / é valente, também poltrão, / leal, comete traição”. Os clerici vagi também foram chamados de “goliardos”; alcunha que ganharam a partir do apelido “Golias”, dado ao famoso Pedro Abelardo – infeliz amante de Heloísa, e por quem foi castrado – que, por esse tempo, além de ser afamado por suas aulas de filosofia, também o era por compor poemas românticos. Aqueles que, por influência de Abelardo ou de Eros, compunham tais canções, “subversivas”, exaltando o amor terreno, foram rotulados como pertencentes à “família de Golias”, conforme consta nos “sagrados e oficiais documentos da Santa Igreja”. O amor, seja ele qual for, conforme o testemunho da vasta literatura, está sempre envolto em confusões dogmáticas e subversivas.

3 comentários:

  1. Gostei deste.Bem informativo. E ô negocinho pra causar confusão né,esse tal de amor?hehe
    bjo

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  2. Amor, sempre o amor! assunto infinito e infeliz para quem o amor foi negado. Pensar em negar, é o mesmo que negar, segundo Pedro Abelardo para quem a intenção era tão importante quanto o ato e analisava de diferentes pontos de vista uma mesma questão."ó que vida execrável! pouco duras, quando curas de nossa mente as mazelas." mais execrável é, quando se vai dessa vida antes de se livrar das mazelas.

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  3. Olha, a Martinha anda lendo Abelardo. Essa coisa da INTENÇÃO, nele, é um ponto forte na sua lógica também, e na moral. Enfim... e uma constatação: DAS MAZELAS, NUNCA NOS LIVRAREMOS. Logo: Ó que vida execrável!!!
    Obrigado a Clarissa também pelo comentário meigo... Bjos pras duas. \o

    (Patativa)

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo