sexta-feira, 31 de julho de 2009

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Do amor fati e do amour de soi. Vencer-se a si mesmo – dizia Zaratustra –, eis o maior dos desafios. Pois não há nada mais terrível, mais violento e mais difícil do que tornar-se o que se é. Mas eu anuncio o novo homem.
Anuncio o homem que chama a ilusão pelo seu nome, o mais cruel de todos: Felicidade. Felicidade fundamentada numa perfeição desconhecida, numa moral milenar que amordaça e maquia a selvageria do amor possível; o único que há, e que os animais sem razão sabem, por nada saberem.
Anuncio o amor possível, o amor fati; o amor que tem aquele que não deseja ter além daquilo que se tem: a si-memo, o seu destino. Para amar com tamanha grandeza, porém, é preciso ter mais do que a razão que compreende o fado e o aceita, e o ama; é preciso ter mais do que a ignorância completa: é preciso o amour de soi, por amor à terra, pela fidelidade à terra e ao que não se esconde por sobre as nuvens.
Somente quem compreende e aceita o longo caminho a ser trilhado nessa ascese pode, de fato, iniciar essa que é sua maior jornada: de dentro de si até o pico mais alto da montanha, onde os ventos fazem morada, e onde se pode ter olhos como os da águia que, sobre tudo, a tudo vêem. Mas é necessário, antes, vencer-se a si mesmo, o que requer, mais do que vontade e sabedoria, bravura homérica e aceitação.
É preciso não temer o despir-se da própria pele com a cortante adaga de Orestes. É preciso não querer mais do que o que se tem, mesmo que o que se tenha seja somente o quase nada; do passado, no presente, no futuro. É preciso ter fidelidade à terra. Somente aquele que deseja o não-desejo, pode ter o que deseja, e ainda assim ser inteiro.
O novo homem há de compreender que, vencendo-se a si mesmo, terá por glória, e das mais altas, a indiferença, a desesperança: Indiferença para com o amor ideal e suas dores, suas prisões; desesperança por não esperar a perfeição do mundo ou de qualquer coisa que esteja no mundo, que é o que há. Tendo os olhos do dia, o homem dos olhos do dia não conhece qualquer noite. O novo homem, a tudo amando com amor fati, pode facilmente, com o amour de soi, nada amar com a paixão, nada temer com a paixão, nada querer com a paixão, com a desmesura.

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo