terça-feira, 28 de julho de 2009

27
.
Dos absurdos. Foi enquanto conversava com Laila que Arnaldo, em um momento de ebulição hormonal, disse, cheio de entusiasmo: “Laila, agora eu não tenho mais medo de dizer que te amo”, e disse, como quem se liberta de um peso enorme: “eu te amo!” Ela, que não esperava aquilo, nem naquela hora, gelou. Como ele poderia dizer “isso”? Quando começou a sair com ele, pensou, não esperava nada disso; não esperava nada. Ficaria com Arnaldo por algum tempo, depois diria adeus, quando fosse a hora de dizer adeus. Ele, no entanto, apaixonado que estava, não desconfiava que ela iniciara tal relação com um fim já premeditado. “Olha, Arnaldo”, Laila disse, segura, “uma vez você me disse que queria que eu sempre te falasse a verdade; que preferiria mil vezes uma amarga verdade do que uma doce mentira, não foi?”. E ele teve que concordar. “Então?”, ela continuou, “eu sei que você gosta mais de mim do que eu de você; e eu me sinto como se estivesse te sacaneando nisso tudo, entende? Quer dizer: eu não te amo, apenas... gosto de você. E não acho que seja justo te esconder isso. Logo logo vai chegar o dia em que eu terei que dizer adeus, que tudo acabou. Por isso, você tem que saber se quer continuar com isso, e se ainda vale a pena”. Dentro dele, como em uma cena escatológica, o mundo pareceu ruir à força daquelas palavras medonhas. Era um misto de frustração, de raiva, de desencantamento... Tudo ficou cinza; tudo girou à sua volta. Ele sentia aquele estranho frio na barriga, como se borboletas voassem dentro dela. Sentia-se como o menino solitário no canto da janela, no desenho triste de Edward Gorey. O que ele poderia dizer naquela hora? Sentiu-se desarmado, e ela com todas as armas. Ao assumir o sentimento que lhe parecia tão natural, porque era fácil amá-la, jamais pensara ouvir o que ouvira. Em troca da declaração amorosa, palavras que cortavam qual navalha. Como as coisas podiam ter tomado esse rumo? Quedou-se, perplexo, resignado, porém. Não, ele não diria nada; não naquela hora. Tinha que pensar, e pensar muito, para não falar bobagem ou qualquer coisa de que viesse a, depois, talvez tarde demais, arrepender-se. Nunca fora tão emotivo; nunca tão racional; e nunca sofrera tanto.
Moral da história: o que mais você ama é o que mais lhe traz a dor, e não há exceção para tal regra.

3 comentários:

  1. Se a moral da história é essa, o Arnaldo (não) tem a mulher certa.
    .
    .

    O senhor escreve muito bem.

    ResponderExcluir
  2. Pois não é mesmo, André?! O Drummond dizia que as cartas de amor são ridículas, e nesse "conto" eu tento dizer o mesmo, trocando-as pelas declarações. Enfim...

    Obrigado pelos comentários, viu?
    E obrigado a você também, Tela. Sempre bom ver as tuas marcas por aqui. Beijo, moça.

    ResponderExcluir
  3. Realidade demais para minha sonhadora mente...lembranças que não são bem vindas...não, eu não quero mais ler esse teu texto e ainda assim ele não deixa de ser bom, mas eu não quero, não, eu não quero, me deixa aqui com minhas esperanças infantis! Bjoss ---> Izabel

    ResponderExcluir

patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo