segunda-feira, 6 de julho de 2009

17
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Dos excessos. Joelza não perdia um capítulo daquela novela. Quando o galã, estrela principal da trama, depois de tantos transtornos e sofrimentos, finalmente conseguiu encontrar a sua “alma gêmea”, Joelza quase morre aos prantos, tão grande foi a sua emoção. Mas quando ele a beijou, recitando mil poesias e fazendo duas mil promessas de amor eterno, Joelza teve um estranho, muito estranho, acesso de ciúme misturado com frustração.
– Que bosta é isso, gente?! Tá tudo errado! Não era pra ser assim o final.
Ela dizia, praguejando a cena e apontando pra TV, igual torcedor fanático brigando com o juiz que rouba contra seu time. Eduardo, seu namorado, que era forçado a ver a novela com ela, do começo ao fim – senão depois não saiam, ou, se saíssem, ela ficava um porre, insuportável –, percebeu a cena de ciúme e, já no limite da chateação, estourou:
– Que é que há, hem, Jojó? Tá com ciúmes do cara, é?
– Mas é que ela não o merece. Olha como eles são contrastantes! Depois de tudo o que ela aprontou, e o modo como o desprezava... E agora, olha isso aí: toda derretida; ele merece coisa melhor...
– Tipo, quem, Joelza? Você?
– Ah, Dudu! Vai à merda, vai!
– Quer saber de uma coisa? Vá à merda você, minha amiga! Sua baranga tresloucada!
E saiu da sala, bufando. Como poderia suportar isso a vida toda?
Mais do que depressa ele se convenceu de que esteve, aquele tempo todo, enganando-se a si mesmo, enganando Joelza e enganando o bucho que era a mãe da moça, que, em relação a ele, sempre se portara como um iceberg, desde o início do namoro que já durava um ano e meio.
O final da novela foi este mesmo: a estrela principal se casando com a outra estrela – como são, geralmente, os finais das novelas –, e um monte de gente, numa cena cafona de festa de casamento, celebrando a feliz união do “príncipe com a princesa”, mantendo viva a tradição bobinha das histórias infantis em que os dois vivem assim, felizes para sempre. Mas a novela que é a vida da Joelza, depois que perdeu o Eduardo para a Juliana, uma ex-amiga do CEFET de Jaguaribe – com quem ele casou cinco meses depois –, continua a se desenvolver lenta e gradativamente, em seus longos, tediosos e solitários capítulos. Moral da história: o mundo real é uma bosta mesmo; mas, prefira-o.

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