segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

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Dos exílios. “Exílio” é uma palavra feia. Exílio também pode ser um sinônimo para “banimento”. Banimento é uma “pena imposta a alguém para deixar o país e não retornar a ele enquanto durar a pena”, diz o Houaiss. Durante o regime militar, no Brasil, muitos foram os artistas que, temendo as prisões e as torturas, fugiram para outros países, auto exilando-se, expatriando-se. Nós, mundos que somos, podemos também, sob certas circunstâncias, viver em um retiro psicológico equivalente a um banimento, um exílio auto-imposto. Também nas coisas do amor é possível, pela presença da ausência do objeto amado, haver uma sensação de estranhamento perante o mundo, como se, embora vivendo nele, nele não estivéssemos – porque, no Outro, nos encontrássemos perdidos. É quando o nosso Eu psicológico, de modo retroativo, epistêmico, faz com que o pensamento se volte sobre si mesmo, que pensemos sobre o amor que, nosso e por nós mesmos, está lançado sobre o Outro, como seta e alvo. Daí que o amor, para ser vivido, mesmo o amour de soi, precisa ser vivido a dois, pois que, senão, não há. Geraldo Carneiro, poeta mineiro, no poema Sobre o amor, que dedica à Tônia Carrero, diz algo idêntico: “Amor é coisa que se faz a dois, / segredo consagrado por um Deus / à sua escolha, a árvore ou a folha / que se despede do país dos ventos / e que acomete esses seus pensamentos / só seus, só meus, só vossos, sempre nossos. / [...] / pois eu, se não existisse o tal amor, / viveria exilado de mim mesmo”. Que é esse exílio senão, mais que no Outro, viver em si somente? O amor de exílio, de Geraldo Carneiro, é o mesmo amor de perdição que encontramos no romance homônimo de Camilo Castelo Branco, ou nas Confissões de Santo Agostinho - com as devidas particularidades, evidentemente. Onde há amor, há o Outro; onde há o Outro, há a perdição, e o inferno. Tal inferno - que se aproxima muito daquilo que é dito por Sartre no texto de Entre quatro paredes, de 1944, feito para o teatro; ou da consciência perturbada de Ivan Ilitch, conforme Tolstói o retrata em A morte de Ivan Ilitch, de 1886 -, é a consciência pessoal (o pleonasmo é necessário) de si mesmo, de si mesmo em relação a si como possibilidade e transcendência, e em relação ao Outro como limite de si, e negação impositiva: memória. Eu sei, eu sei: parece uma conclusão absurda; mas, se vamos até o fundo de qualquer conclusão (no sentido teleológico, finalíssimo), o que não parece? Enganam-se aqueles que, no amor (ou através dele), desejam encontrar um caminho para fugirem de si mesmos, pelo Outro, pelo serviço ao Outro. Todo mundo é uma ilha.

6 comentários:

  1. Meu querido, posso fazer um XTudo com nada dentro? kkk É que quando eu li EXÍLIO eu lembrei imediatamente do povo judeu exilado no egito e a proposta de libertação de Deus.

    "Liberta o meu povo para que ele me SIRVA no DESERTO."

    Deus queria um povo livre para lhe SERVIR nas piores condições (no deserto) para finalmente conceder-lhes a terra prometida.

    Isso é o que eu chamo de proposta indecente! (Com todo respeiro, claro! kkk)

    Seu texto está maravilhoso! Gosto de verdade do que você escreve e como escreve. Muito didático, coisa boa de professor - Adoro!

    Prometo depois fazer um comentário que preste kkk

    Beijos.

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  2. O amor é uma ilha só de si...
    Dois podem se amar, mas dois também se exilam. Dois se amam e se exilam porque poetas são exilados no amor, como sendo fruto de tudo o que é vida... O amor é uma ilha da qual, todos naufragamos, essa ilha faz a vida valer a pena, mesmo diante de tantos filósofos e escritores e pensadores.
    Assim como Tolstoi foi sempre um exilado da sociedade, um quase indigente, algumas vezes até demente.
    Assim como Camilo teve uma vida naufragada, impulsiva e romântica, assim como Satre foi um existencialista com um exilo na sua mais que tudo e amante Simone de Beauvoir, que por sua vez se exilou nessa paixão frenética e ilhada de tantas avenças e vontades loucas, tão bem descritas na "A convidada", assim como todos os génios e grandes pensadores são exilados e ilhados eles também têm um pecado mortal: o amarem demais!
    Então; e a jeito de conclusão, sobre tão belo e maravilhoso texto, ouso dizer que, todos nós para amarmos e sermos felizes, temos que quebrar regras e nos exilarmos dentro do nosso coração. É nele que reside todo o amor do mundo e dos homens.

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  3. Meu querido, será que entre uma ilha e outra, não é possível encontrar um braço de mar?

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  4. Eu achei meio pessimista,mas entendi o que vc quis dizer!\o/ hehe
    Eu acho que o amor nos amplia até o outro,e com o outro a gente pode ser mais a gente ou menos,daí depende de cada relação,etc etc Aí acho que a ilha de si não vira necessariamente a ilha do outro,mas a ilha de si com o outro,sabe?Gostei do texto,me fez refletir!
    bjo!

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  5. Cla,

    obrigada por clariar minhas idéias, eu acho que eu não tinha entendido NADA de NADA. Nadinha mesmo. hehe

    Professor, eu acho que tinha lido seu texto umas 5 vezes e quanto mais eu lia, menos eu entendia... agora, vou colocar os óculos da Cla e vou ler pela 6ª vez... será que agora eu alcanço?

    Beijos.

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  6. Obrigado à Letra, Clarissa e ao Poeta, que comentaram o texto. Obrigado a quem leu também, embora não tenha comentado. Vocês me fazem ter vontade de ataulizar o blog com mais freqüência. Um beijo a todos/as.

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo