segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

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Dos encantos e desencantos. Os apaixonados, coitados, vivendo no mundo da Lua, “acreditam firme e honestamente que o casamento será a realização da sua paixão em toda pureza e fantasia. Mas todo mundo sabe, menos os apaixonados, que na vida real não acontece assim”, diz Rubem Alves em Quarto de badulaques (2003). É, na vida real, isso não acontece mesmo! A fantasia boba do “e os dois viveram felizes para sempre” só existe no mundo do faz de contas, que nem na estória da Cinderela, da Branca de Neve e noutras mais, do mesmo naipe. Em tais estórias, o príncipe do cavalo branco é sempre príncipe, sem nunca tirar a sua roupa de príncipe, sem fazer cocô, sem soltar pum, sem ter coragem de beber cachaça e cuspir no chão, e sem deixar respingo de mijo na tampa da privada... Tudo é perfeitinho e azul e rosa. Um sonho de... sonho. Ah!, quanta ingenuidade a dos apaixonados! Quanta ingenuidade quando pensam que a fantasia louca, o transe da paixão, durará para sempre. Quem também fala sobre isso é Gabriel Lacerda, no hilariante, porém sério, As lições de Godofredo (2000) – sábio profeta da doutrina hedo-cristã. Através de Godofredo, a exemplo do que faz Nietzsche por meio do seu Zaratustra, Lacerda diz que essa história de príncipe e princesa, tal encontrada nas estórias de príncipes e princesas, nada mais é do que uma “técnica sutil [na qual] as pessoas começam, de forma subliminar, a construir um conceito de felicidade no inconsciente. A felicidade, segundo os contos de fadas: obtém-se pelo casamento; está associada à riqueza e ao poder (de um modo geral, somente o príncipe e a princesa são felizes); é um estado que permanece por muitos e muitos anos; e, sobretudo, depois dela, vem o ‘fim’. Essa idéia do que seja a felicidade é evidentemente distorcida. A felicidade dos contos de fadas seria o estado idiotizado da ausência de aspirações, compartilhado por um homem e uma mulher ricos e poderosos, que passam muitos e muitos anos vivendo (e provavelmente engordando) juntos, até que morram de velhice”. É; além dos príncipes e das princesas, existem os plebeus; aquelas pessoas comuns que, devido a uma ordem hierárquico-social e política, e devido à sorte, não podem/puderam ser príncipes, nem princesas. E eles têm que aprender a ser felizes assim mesmo, da forma que podem; pois, como diz o Rubem, “as rotinas do dia-a-dia não combinam com fantasias amorosas. Casados, os apaixonados na casinha pequenina terão agora de lidar com uma porção de coisas banais e irritantes. Por exemplo, o pingo de xixi na tampa da privada...” Um dia ainda hei de botar juízo na cabeça de Maria Helena, e ela ainda há de tocar fogo nas suas Barbies, e afogar na privada todos os seus clones malditos do maldito Ken. Um dia!

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo