quinta-feira, 15 de outubro de 2009

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Das insaciabilidades. O amor romântico é como um buraco negro que se esconde no interior de cada um, no interior de todo mundo. O que os dedos são para as mãos, assim também a falta para o amor, e a necessidade de ter mais, ser mais, sempre mais... Ele, ao mesmo tempo em que quer atrair o objeto amado, também o repele – mesmo que não saiba onde guardá-lo para, quando vier a falta, reavê-lo, e aí querer a falta novamente. Existem mundos paralelos; e boas teorias já tentaram demonstrá-lo. Boas teorias são como remédios que todos dizem serem bons, mas que ainda não tiveram seus princípios ativos clinicamente comprovados. O grande amor de um é a grande dor do outro; pois que sempre há um amor que é mais forte que o outro, um que ama mais que o outro – e isso é assim em todas as relações amorosas. Quanto mais esse ama, tanto mais sufoca o amor daquele. Pois que o amor quer sempre conter em si o objeto do seu amor – como se ele mesmo, o que ama, se visse refletido em uma sala, rodeado de espelhos. Ora, o amor, sendo amor por algo, não pode ser amor apenas por si mesmo. Mas só é assim, e assim somente, numa extensão que faz de si mesmo - e eis aí a grande contradição dinâmico-antitética -; como quando alguém abraça a outrem é diz, com o peito repleto de buracos negros: “eu queria você dentro de mim”. O romântico tem dentro de si buracos que são, acredita, na exata proporção do objeto do seu amor – só ele (ou ela) o “completará”, pensa. Daí o amor ser também, por natureza, antropofágico, antropomórfico. Daí também Ludwig Feuerbach dizer, aprofundando o sentido da afirmação de Hipócrates (trata-se do materialismo histórico em oposição à metafísica): “O homem é aquilo que come” - o duplo sentido, aqui, é necessário e inevitável. Não é assim que o corpo todo se mantém, com a absorção do outro? Não é por isso também que algumas tribos bebem as cinzas do morto, para que ele, nelas, nos vivos, permaneça vivendo? No final das contas, nesse desejo absurdo que o amor tem de possuir o objeto do seu amor, é a vida que, novamente, dá as cartas, escondida sob o manto do mais profundo do profundo desejo amoroso. O amor é um buraco negro que suga tudo para, na sua outra extremidade, alimentar a vida. O vazio é só um conceito. Para onde os buracos negros regurgitam aquilo que sugam? No caso do amor, para mais amor, mas vontade, mais falta. Sem essa dialética, a vida não seria possível.

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