terça-feira, 9 de junho de 2009

Livro 1
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Onde são dados exemplos cotidianos do amor romântico, e do trágico que impera no mundo. A dor, como na filosofia de Arthur Schopenhauer e nos filmes de Werner Herzog, é o motor de tais modelos que, somente do Livro 2 em diante, serão aclarados.
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Das amorosas opções. Etelvina amava Marcelo, a quem chamava de Marcelinho, “meu Marcelinho”. Mas então, oh, lástima do acaso!, surgiu Vicente; que a mulherada toda dizia ser um “poço de perdição de boniteza”. E Etelvina, que amava Marcelo, viu aquele amor todo voar para os olhos de Vicente, os cabelos de Vicente, a boca de Vicente, e tudo o mais que dizia respeito ao Vicente. Viva Vicente para presidente! Pois vocês não sabem?!... O amor é sempre assim, exagerado. Grita nas vias públicas; envia torpedos e recados melosos no Orkut; é grudento e adocicado igual suco de mangaba, ou doce de goiaba. O amor tem dessas macaquices: está num galho, fazendo caretas e comendo piolhos da cabeça do outro e achando tudo lindo e maravilhoso; daí, “de repente, não mais que de repente” – que nem no poema do Vinícius –, pula para outro galho mais verdoso, segundo o seu incerto e fogoso juízo. E “do riso faz-se o pranto. De repente, não mais que de repente”. É por isso que o amor também vive acompanhado da dor, por causa da sua constante inconstância. Vez por outra, naqueles pulinhos, um galho desses se parte, e o amor, cheio de si, pesadão, despenca galho abaixo, vai ao chão. Já viu um amor durar para sempre? Nunca! Só naquelas histórias bestinhas que contam às crianças de oito anos: “... e os dois viveram felizes para sempre”. Não, meu amor. O amor, na vida real, é como a fé: está em tudo, mas é cego e burro, muito burro... burricíssimo! Quem tem razão é o Hermann Hesse, quando diz: “A fé não passa pela inteligência; e muito menos o amor”, e, noutro lugar: “Crer é confiar, não pretender saber”. Pelo mesmo caminho vai o “amor romântico”, mas ele próprio (a Vontade), que nada tem haver com “romantismo”, sonha sempre com um galho mais verde que aquele onde se pendura; sonha sempre com um rosto que nunca mude – como se quisesse para si uma estátua que fosse viva. Mas acontece de as árvores secarem, e o amor, que não gosta de pau seco, anda sempre por outros galhos. E é assim que sempre vai ter gente besta dizendo que vai amar para sempre aquele – ou aquela – que diz amar; e é assim que, também, surgem as tolas promessas de que nunca vai haver um galho mais verde e mais vistoso que esse que agora se tem – pois que o amante sempre pensa em possuir o amor do outro. E na sua felicidade do momento, deseja a eternidade. Daí Nietzsche, por boca de Zaratustra, dizer que “todas as coisas acham-se encadeadas, entrelaçadas, enlaçadas pelo amor” e que inutilmente dizemos ao sofrimento: “Passa... [...]! Pois quer todo o prazer – eternidade”. E daí também o Manoel de Barros, numa tirada de mestre, dizer que “[as] duas coisas que não vão acabar nunca no mundo são: gente besta e pau seco”.

4 comentários:

  1. Quer uma ilustração, veja o vídeo:
    http://www.youtube.com/watch?v=rxlaZxkJZGE

    A Sarah Falcão que me mostrou. Dela também é a foto ilustrativa do Blog.

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  2. Estive por aqui conhecendo o seu blog!!! Abraços Ademar!!

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  3. Pessimista, meu caro. Discordo, o amor é velhinho, senta em cadeira de balanço e é sempre saudoso, percebe o tempo, e sua passagem inexorável e também a sua crueldade.
    Isto que nos carrega de galho em galho, que nos guia, que nos leva a aventuras infindáveis é a danada da paixão, que também tem de suas virtuosidades.
    Abraço.

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  4. Pessimista, nada. Os próximos textos me explicarão. Paixão = "vontade" (Schopenhauer / Nietzsche), "pulsão" (Freud). Não há nada tão passageiro quanto a paixão. E, como digo numa das músicas da Madalena Moog: "Casar por amor é invenção de dois séculos só / O romance ideal serve bem ao Mercado / Pra vender livros, filmes e novelas..."

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo