quarta-feira, 24 de março de 2010

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Das perturbações da alma e de uma borboleta pintada por Mabel. Comprei, por ocasião do seu lançamento no XI Encontro Nacional de Filosofia da ANPOF (2004), em Salvador, Bahia, o livrinho de Maria de Lourdes Borges, que tem o Amor estampado como título. Além de dedicado a mim, a caneta, o tal é dedicado, na impressão, “a um certo A.”, que Maria de Lourdes diz ser o seu “estóico preferido”. Dedicatória essa que, segundo me parece, é uma fala da paixão. Mas, ironicamente, é justamente contra as paixões (que, no latim, também pode aparecer como perturbatio, “perturbação”), que trazem intranquilidades à alma, que a filosofia estóica se posiciona, se impõe. Maria de Lourdes, evidentemente, entende isso muito bem, e ao fazer a interpretação de um certo texto de Sêneca, afirma: “Toda perturbação da alma é nociva para a vida do sábio, logo, toda perturbação deve ser aniquilada. Se todo o amor for perturbação, então o sábio deve tentar extingui-lo”. “Muito bem”, pensei, “ela não disse em lugar algum que era estóica”. Se fosse, seria a aplicação exemplar do conhecido ditado popular que reza: “Em casa de ferreiro, espeto de pau.” Mas, afinal, nas coisas do amor, nessas perturbações da alma, quem não usa uma máscara? Epicuro, Sêneca, Marco Aurélio e tantos outros sábios antigos que procuravam a felicidade (eudaimonía) na ataraxía (imperturbabilidade), na adequação do corpo e da mente ao curso natural do mundo (da natureza), não puderam escapar dessa máxima da vida, da Vontade de viver: amar não é opção (racional ou emocional), é imposição da natura. Na primeira página de Amor, uma dedicatória irônica, para mim: “Para Antônio, para que aprenda um pouco sobre o amor, Mª de Lourdes”.
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Hoje é o último dia deste ano de 2004, um dia quente... E eu tenho à minha frente o quadro que mostra uma borboleta pintada por minha mulher, Mabel, ainda quando criança. Na pintura, a borboleta não tem flor nenhuma, não repousa sobre nada. O meu amor, Maria de Lourdes, é uma borboleta morta; a minha primavera, uma pintura.

Um comentário:

  1. Sempre leio do Grande Livro do Amor. Como não vi esse texto? qualquer detalhe é motivo para a memória trazer o passado com toda a intensidade de um presente vivido. Fiquei feliz com o texto, e com a imagem da borboleta, que não vai ser esquecida enquanto vida tivermos. Tem uma cachoeira na minha frente! Não estou vendo a tela do pc, mas a borboleta eu vejo muito bem! obrigada pela beleza e o encanto dessa lembrança!!!

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo