segunda-feira, 22 de março de 2010

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Da eterna repetição do mesmo e do pêndulo de Schopenhauer. Salomão, filho de Davi e rei de Israel, apregoando um certo tipo de eterno retorno do mesmo, disse mais de uma vez: “Nada há de novo sobre a terra”. Não sei até que ponto uma afirmação assim tão geral poderia se sustentar; mas isso não vem ao caso, agora. Seja como for, ao menos de exemplo, aqui, serve. Assim, e por exemplo: tudo o que eu já disse sobre o amor, até aqui, com algumas pequeninas variações, já fora dito por Lou Andréas-Salomé em um livro de 1910, o Die Erotik (Erotismo). Lou, para quem não sabe, foi acusada por alguns de ser, pelo enorme fascínio que exerceu em Paul Rée, responsável por influenciar diretamente em seu suicídio; outros dizem que ela tem certa parcela de culpa pelas loucuras de Nietzsche e de Reiner (nome com o qual ela o rebatizou, em lugar de René, que julgava meio efeminado) Maria Rilke. Tanto a morte de um quanto as loucuras dos outros, conforme dá a parecer H. F. Peters, em My sister, my spouse: a biography of Lou Andreas-Salomé, de 1962, foram causadas pelo amor que todos lhe tinham, sem que pudessem possuí-la, como queriam. Lou, que tinha insaciável gana de liberdade, era inquebrantavelmente fiel a si mesma e, por isso, era incapaz de ser fiel a qualquer outro; rejeitava a fidelidade por amor à fidelidade – pois, do contrário, trair-se-ia. É que o amor, para Lou, como eu já espero ter demonstrado, é tão somente o nosso instinto mais primitivo, transvalorado, domesticado, maquiado pela civilidade; uma “coisa” biológica que a razão explica, mas que não domina. A idealização que dele, às vezes, se faz, escapa ao seu mais intrincado fundamento – e aí o erro de amar demais, perder-se no (ou de) amor. “Para Lou”, diz Peters, “o amor é antes de tudo uma necessidade física, como a fome ou a sede, e só pode ser bem compreendido se for considerado assim. Tendo raízes no subsolo de nossa vida, vamos encontrá-lo associado até mesmo aos processos puramente vegetativos do nosso corpo, como os sonhos. É uma força animal, pura e simples, mas no homem, animal superior, a pulsão sexual está combinada com uma influência mental que provoca uma excitação nervosa. A pulsão sexual transforma-se então em sensação. Isso leva a idealização romântica do amor e ao desejo de sua permanência. Exigimos daqueles que amamos uma fidelidade eterna”. Sim! É claro que Freud, que foi amigo pessoal e professor de Lou - a quem ela, em 1931, dedicou um livro seu (Main dank na Freud [Minha gratidão a Freud]) -, confirmaria mais adiante isso tudo que ela dizia, ampliando tais idéias nas teorias que já conhecemos bem. O amor, assim dito, é uma necessidade humana, como também é a capacidade de fantasiar sobre tudo, inclusive sobre ele. Peters, noutro lugar, ainda interpretando Lou, afirma: “Na realidade, porém, toda necessidade humana é logo satisfeita e reclama, a grandes gritos, uma modificação. O amor realizado morre de saciedade”. Isso aí, novidade nenhuma, é reprodução do conceito de amor apregoado por Diotima, conforme narrado por Sócrates em O banquete, de Platão. Principalmente nas coisas do amor, não dá pra ser diferente, porque, como já foi dito: “nada há de novo sobre a terra”. Desejo realizado é satisfação passageira, e tédio (Schopenhauer). Amor é carença, carença é falta e, falta, é Vontade, Desejo e sofrimento: do Desejo ao tédio, do tédio ao Desejo – o pêndulo de Schopenhauer. Adélia também se repete, e repete os sábios antigos: “Amor é sofrimento, é descontentamento”; e Camões faz o mesmo: “É ferida que dói...”; e eu e você experimentamos isso, mesmo que nunca escrevamos um livro, façamos um poema, enlouqueçamos de/por amor. Ferida que dói é no corpo, e, corpo e dor, isso nos temos!

Um comentário:

  1. Sobre Lou, eu diria: "Em terra de cego, quem tem um olho é rei", tivesse Nietzsche me conhecido, teria se apaixonado por mim e não por ela kkkkkkkkkkkkkkkk brincadeiras à parte...

    Essa mulher, foi uma mulher que "frequentou" mentes preciosas, gente com muito conteúdo, como Nietzsche, Paul Rée, Rilke, Freud entre outros e amealhou de todos eles tesouros intelectuais preciosos o que fez dela, principalmente no seu tempo, uma mulher no mínimo singular.

    Quanto a sua postura feminina libertária... não sei não... não sei se ela foi verdadeiramente uma mulher livre... sinceramente? Penso que não! Muitos citam a "grandeza", "beleza" da fidelidade de Lou a ela mesma, ou seja, ao que ela pensava, mas pelo que sabemos sobre o casamento dela com Carl Andreas... bom... na minha santa ignorância, vejo-a voar nessa relação, mas como uma pipa, não como um pássaro. Não parece curioso que de todos os seus “amores”, Carl, tenha sido o mais financeiramente estável? Não parece essa relação, uma relação de interesses outros além do amor (?), amizade (?)... Talvez a moça tenha sido mais esperta que livre, e uso esperta com a conotação brasileiríssima que tem tal palavra. Nos dias de hoje, a mulher que se comportasse assim, não seria chamada de Perigueti? Mas como Lou não dançou em Cabarés, antes escreveu livros, podemos citá-la como ícone de sabedoria e liberdade para a alma feminina... Entretanto, Lou Andréas-Salomé, sem dúvida, sob muitos outros aspectos é um abismo intelectual irresistível, fascinante.

    E para as questões do amor, eu prefiro crer, mesmo contra todos os filósofos e suas vãs filosofias que, sem alegria não há amor, porque amor que só doi não é amor, é culpa. Autoflagelação. Eu nasci pra ser um Peixe Vivo!

    É impossível não te ler... adoro!
    Bjs.

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo