domingo, 14 de março de 2010

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Da baixa auto-estima e outros penhascos interiores. O que alguns pseudo-estudiosos do comportamento humano dizem do amor, às vezes, quando não é repetição do que todos já sabem, mais do mesmo, é ou cômico ou absurdo. É o caso do que li em Your child’s self-esteem (de 1975), da americana Dorothy Corkille Briggs: “A maioria das pessoas tem medo de gostar de si mesmas, ao menos de gostar demais”. O oposto disso é verdadeiro, sem exceção nenhuma. Na verdade, e para efeito de espontaneidade, não existe isso que as pessoas chamam de “baixa auto-estima”. O que uma pessoa sente em relação a si mesma é sempre um sentimento de universalidade macro-cósmica em relação a microcosmos. No meu mundo, enfim, tudo gira em torno de mim mesmo, do mundo fenomênico [físico-orgânico] que se dá a mim e, só então, ao Outro – que vive em seu próprio mundo e, à parte, comigo, faz parte do mundo nosso: este que nos aparece, nos é, de algum modo, comum e estranho. É assim que o homem se faz lobo do homem (homo homini lupus), como dizia Plauto. Quer dizer: tudo o que existe no mundo existe para o seu benefício, ou então para a sua ameaça; o que fazemos é reagir a isso, de um jeito passivo ou ativo, a depender das situações. Você já deve ter ouvido isto: “Cada pessoa é um mundo”? Nada mais verdadeiro. Quando alguém afirma que está com a estima baixa, na verdade, está dizendo que as coisas nos demais mundos não estão se comportando corretamente ao seu favor, como deveriam se comportar. Pensando nos “outros”, em como os outros deveriam agir para que o mundo fosse melhor, essa pessoa pensa somente em favor de si mesma, do seu mundo. “Mas”, alguém poderia argumentar, “o suicídio não é uma demonstração de baixa auto-estima? De falta de amor-próprio?” Na verdade (isso é Pascal quem nos diz), o suicídio é, muito provavelmente, a maior demonstração que alguém pode dar a respeito do grande amor que tem por si mesmo. Quando os mundos parecem não girar em favor do suicida, a morte procurada se torna uma válvula de escape contra a infelicidade de viver “isso” que se vive, torna-se a passagem para um “outro mundo”, quiçá mais venturoso. Nas palavras de Pascal: “Todos os homens procuram ser felizes; isso não tem exceção... É esse o motivo de todas as ações de todos os homens, inclusive dos que vão se enforcar...” Compreendendo tudo isso, fica também evidente o paradoxo do/no argumento do Dr. Walter Doyle Stapes, em Pense como um vencedor (lançado no Brasil pela editora Pioneira, em 1995): “A baixa auto-estima”, diz ele, “tem um efeito profundamente negativo sobre a personalidade e o comportamento humanos. A maioria dos psicólogos acredita que a baixa-estima, mais do que qualquer outro fator isolado, é a causa da maior parte dos distúrbios psicológicos, a razão principal da epidemia de fracassos humanos e da resultante miséria em nossa atual sociedade. Testemunhos disso são o aumento no abuso de drogar e álcool, na criminalidade, na gravidez de adolescentes, na violência doméstica, estupros, promiscuidade e abuso sexual de crianças”. Quanto absurdo! Livros de auto-ajuda, definitivamente, não ajudam em nada – a não ser em manter as pessoas na embriaguez que lhes diz que tal remédio, placebo, oferece toda cura para todo mau. Na verdade, e para o que diz respeito às palavras do Dr. Stapes, se você quer que realmente isso aí tenha algum sentido, então você deve ler tudo o que ele diz ao contrário: é a auto-estima das pessoas que lhas conduz ao álcool, à criminalidade, ao sexo, a isso e aquilo outro. A motivação do estuprador de criancinhas, do pau-d’água e do fracassado, mais do que embasada numa pseudo “baixo alto-estima” (o próprio termo é uma contradição), é enraizada em seu/nosso enorme amor-próprio (amour de soi), no seu/nosso desejo maluco de que tudo, no(s) mundo(s), gire sempre em seu/nosso favor.

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo