terça-feira, 9 de março de 2010

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Do amor adolescente. Mais que os adultos, aos quais a moral (a cristã-ocidental, ou outra qualquer, patriarcal) já impôs as normas constitutivas da sagrada família, que é sempre vista como instituição divina e essência geradora (ou constitutivo-mantenedora de uma ordem), os adolescentes experimentam – ainda que coagidos por certos rudimentos da lei da coletividade, sempre restritiva, punitiva – algo do amor primevo, ou seja, aquele mais puro amor, animal, e, logo, para os adultos, mais irresponsável. É que os adolescentes são todo-hormônios, testosterona, libido... tudo neles está em ebulição, transformação, evolução. Um passo adiante, qualquer que seja, significa luta: deixar atrás de si o que se era, se pensava, vencendo-se a si mesmo e, também, ao Outro. Pólemos. O amor que sentem é, assim, um amor de competição – não é assim que o processo seletivo se afirma? (Darwin). O namorado de Letícia é, para Letícia, uma “arma contra as suas amigas”, contra a sua potencial extinção: “Vejam o meu namorado; como ele é gato!”, ela diz, ou pensa, ou algo lá dentro dela, que ela nem faz idéia, lhe diz isso de modo calado, puro instinto. Ela, com/por isso, quer dizer às outras: “Eu posso mais do que vocês; fui escolhida [eleita] por ele; estou no topo da pirâmide que diz que, das belezas aqui, sou a maior, a melhor para gerar filhos mais aptos às próximas gerações.” Competição, progresso. Sim, é verdade: Letícia, em seu namorico, ainda não pensa em ter filhos; mas ela não sabe que não sabe disso. Quem lhe denuncia é o seu jovem corpo exitado pelos beijos e abraços do namorado, ou as suas mais ingênuas manifestações maternais – como quando ainda era criança e brincava com as suas bonecas: fosse a do bebezinho que fazia xixi e chorava, ou aquela da Barbie, que é uma especie (modelo) de padrão de simetria, de estética, dizendo ao inconsciente coletivo que tal padrão - embora a cultura (que é engenho nosso), com o tempo, possa fazê-lo variar - é o ideal, que pode gerar outros exemplares simétricos, perfeitamente ordenados conforme as preferências estéticas do Mercado e da saúde. O amor adolescente, ou dos/nos adolescentes, é o amor da auto-afirmação: usa-se o outro, o mais belo possível, para, a si mesmo, afirmar-se como belo, como bom reprodutor ou boa reprodutora que pode gerar bons reprodutores. No final de tudo, mascarada nas disputas que, às vezes, dilaceram corações, está a vida, a Vontade de vida, de eternidade.

3 comentários:

  1. Esse texto está maravilhoso.
    É um tema muito interessante.O amor na adolescencia, e as implicações na sociedade, bem como a ação da seleção natural, e de comportamento...
    Amei ver o Darwin no texto.
    hehehe...

    beijo.
    Desculpa não comentar melhor. é a falta de tempo.

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  2. Tenho uma filha adolescente, de 15 anos, e isso que você diz, professor, é exatamente o que eu noto nela, no jeito dela se comportar em determinadas situações, com amigas, etc. Que coisa maravilhosa esse seu texto. Por favor, nos avise se o mesmo for publicado. Quero tê-lo como livro de cabeceira. Sei que parece clichê, mas é como gostaria de tê-lo, para ler e dormir refletindo. Já pesnei em fazer um blog, mas eu não saberia o que dizer nele. Um abraço,
    Eliana Rosa.

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo