sexta-feira, 5 de março de 2010

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Das incógnitas e da ignorância feliz. Machado de Assis, como se um Heráclito fosse, sabia ser enigmático, profundo, obscuro. Ao menos é o que uma citação sua demonstra, quando trata sobre o amor, o amor de cada um: “Cada qual sabe amar a seu modo; o modo, pouco importa; o essencial é que saiba amar”. A parte em itálico fui eu quem colocou, para dizer que, aí, fiquei pensando no amor que têm os pedófilos, os estupradores, os fratricidas... “O modo, pouco importa...” Importa, sim! Claro que importa! Os meios não justificam os fins, mas, sim, o contrário (Maquiavel). É evidente que Machado de Assis não falava disso de uma perspectiva assim, nossa, pessimista; e, sim: é preciso sempre atentar para o contexto et cetera... essas coisas da hermenêutica. É preciso, e muito, levar em consideração essa colocação, e até as suas últimas consequências – porque Machado de Assis tinha em mente um freio moral para os amantes (mesmo uma leitura superficial da sua obra revelará isso), como aparece no final da citação: “o essencial é que saiba amar”. E aí é que se mostra todo o problema: saber amar. Saber amar implica em saber o que é(são) o(os) amor(amores). Saber sobre o amor, mesmo, é como explicar o arco-íris: vai-se a poesia, o encanto mágico: sobra a ciência, a mágica explicada, desencantada. Não indo a poesia, ficando o encanto mítico, é a Vontade cega a lançar indivíduos contra indivíduos, de muitos e variados modos – como também faz o fiel em direção ao objeto da sua fé, lançando-se, sem duvidar: porque senão se perde, e vira ou teólogo, ou filósofo, ou ateu, ou herege. Fé e pensamento não se unem, a não ser conceitualmente; o mesmo vale para o amor e a razão. Amor e fé, dois nomes para a ignorância feliz.

Um comentário:

  1. "Fé e pensamento não se unem, a não ser conceitualmente; o mesmo vale para o amor e a razão" Concordo completamente! Um abraço professor!

    Larissa

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patativa moog, amor, filosofia, felicidade, paixão, desejo